Agrotóxico liberado pela Anvisa pode atacar sistema nervoso e causar malformações congênitas

Por Aécio Gonçalves 23/11/2017 - 14:52 hs

Pesquisadores e organizações não governamentais querem o Governo Federal cancele o registro que autoriza o uso do Benzoato de Emamectina, agrotóxico aplicado no combate a pragas em plantações, especialmente de um tipo de lagarta. A  professora do departamento de Bioquímica e Imunologia da UFMG,  Eliane Novato, alerta: “Essa substância já teve o registro no Brasil negado pela Anvisa em 2010 por ser considerada na época extremamente neurotóxicos para o sistema nervoso e com grande evidência de provocar malformações congênitas”. 

Novato ressalta que a liberação do Benzoato de Emamectina ocorreu após uma consulta pública muita rápida. O produto é usado para controle de pragas nas culturas de algodão, feijão, milho e soja. 

“No nosso ponto de vista ela não deveria ser usada em hipótese alguma. Primeiro porque mostrou uma toxicidade muito alta mesmo em doses muito baixas. O outro problema é que os agrotóxicos, muitas vezes, apresentam efeitos crônicos. Ou seja, quando a gente fala em uma dose máxima permitida estamos nos referindo a efeitos agudos, mas a gente tem muito pouco controle sobre os feitos dessas substâncias depois de meses, anos de exposição”, reforça o alerta. 

Eliane Novato e outros pesquisadores brasileiros fazem parte da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida. A aprovação do Benzoato de Emamectina foi repudiada por meio de nota pela campanha. Confira a íntegra abaixo:

Sem alarde, o diário oficial publicou a aprovação de um agrotóxico extremamente tóxico para a saúde humana: o Benzoato de Emamectina. São vários os motivos da nossa indignação com esta decisão:

Em 2010, a Anvisa já havia negado o registro desta substância por suspeita de malformações e elevada neurotoxicidade, ou seja, causa danos elevados ao sistema nervoso. Será que nosso corpo evoluiu, e ficamos resistentes a este veneno?

Ao contrário de outras consultas públicas, desta vez não houve divulgação por parte da Anvisa ao atores interessados. Prova disso é o número de contribuições recebidas: 8. Para termos uma ideia, na consulta referente ao Carbofurano, foram 13.114 contribuições. Qual a explicação para tal discrepância, senão a falta de publicidade dada pela agência? Enquanto a consulta do Carbofurano durou 60 dias, a do Benzoato de Emamectina durou apenas 30 dias. Qual motivo da distinção?

A decisão pela aprovação do Benzoato foi dada em tempo recorde. No caso do Carbofurano, a consulta pública findou-se no dia 25 de fevereiro de 2016, e a decisão da Anvisa foi proferida há poucas semanas, no dia 18 de outubro de 2017 – 20 meses depois. Agora, no caso do Benzoato, transcorreram-se apenas 21 dias entre 15 de outubro, quando a consulta pública terminou, e o dia 6 de novembro. Para banir o Paraquate, foram necessários 10 anos, e faltam ainda 3 anos para o seu banimento completo. Porque tamanha demora para proibir, e tamanha celeridade para aprovar?

O Benzoato de Emamectina foi centro de outra disputa em 2013. Após um surto da lagarta Helicoverpa, causado pelo uso do milho transgênico que exterminou seu predador natural, o Ministério da Agricultura importou o agrotóxico de forma emergencial, e na época sem autorização da Anvisa.

Mesmo que a substância seja aprovada para uso em outros países, somos (ou deveríamos ser) um pais soberano, livre e independente dos interesses das grandes corporações. A autorização em outros países não significa que o produto seja seguro aqui, onde grandes volumes são utilizados, onde o uso de EPI e impensável dadas as condições climáticas, onde o congresso nacional defende os interesses dos setores ruralistas, onde os órgãos de fiscalização do estado sucateados, onde o SUS esta sendo desmontado e subfinanciado e não tem dificuldades em atender à demanda de doenças causadas pelos agrotóxicos. Pelos mesmos motivos, o banimento em outros países deveria ser motivo de banimento imediato no Brasil.

É inadmissível expor a sociedade a estes riscos, sem nenhuma possibilidade de participação ou interferência dos maiores afetados: nós. Pelo contrário, a Anvisa que vem promovendo “DRs” com a indústria, se mostra incapaz de dialogar com o povo.

Exigimos que a Anvisa apresente os estudos que embasaram esta súbita mudança de opinião, e que cancele o registro do Benzoato de Emamectina até que a sociedade seja ouvida e consultada se deseja correr este risco. Terminamos com um trecho do Parecer Pelo Indeferimento do Benzoato de Emamectina, publicado pela própria Anvisa em 2010 (e que subitamente sumiu do site da Anvisa):

Os efeitos neurotóxicos são tão marcantes e severos que as respostas de curto e longo prazo se confundem, isto é, efeitos tipicamente agudos são observados nos ensaios de longo prazo, e vice-versa. O produto revelou neurotoxicidade para todas as espécies e em doses tão baixas quanto, por exemplo, 0,1 mg/kg em camundongos e 0,5mg/kg em cães, mesmo em estudos onde este efeito não estava sendo investigado.

Incertezas no que diz respeito aos possíveis efeitos teratogênicos, e certezas dos efeitos deletérios demonstrados nos estudos com animais corroboram de forma decisiva para que não se exponha a população a este produto, seja nas lavouras, ou pelo consumo de alimentos.